A CDU realiza no próximo dia 13 de Julho a sua Conferência Autárquica. Trata-se de um espaço de debate, apresentação de propostas e linhas de orientação para a intervenção autárquica, não só no período eleitoral em que vivemos mas, igualmente, para uma posterior continuidade do trabalho de ligação às populações e de defesa dos seus legítimos interesses e aspirações.

O texto que aqui apresentamos constitui um documento aberto à discussão e a todos os contributos viáveis que possam permitir a sua melhoria. Agradecemos a participação.

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CONFERÊNCIA AUTÁRQUICA

13 de Julho de 2013

1 - Introdução

O Poder Local democrático nascido da Revolução de 25 de Abril de 1974, um dos pilares fundamentais do regime e edifício democráticos português, enfrenta, a exemplo de outras instituições nacionais, uma profunda ofensiva que visa, no essencial, desvirtuar as suas funções e competências, cercear a sua autonomia política, administrativa e financeira, submeter a sua actividade aos ditames e controle do poder central. Tal como sucede às populações e aos trabalhadores com a perda ou desrespeito por direitos adquiridos e (ainda) consagrados na Constituição da República Portuguesa, o Poder Local, nos últimos anos manietado na sua acção e capacidade interventiva através da redução dos seus meios, nomeadamente financeiros, por um lado por via da diminuição das transferências provenientes do Orçamento de Estado e por outro pela diminuição acentuada da actividade económica e da capacidade das famílias, é agora confrontado com os desígnios contidos no famigerado acordo estabelecido pelos denominados “partidos do arco do poder” (PSD, PS, CDS-PP) com a tríade UE/BCE/FMI, visando a sua total submissão a uma política de cariz profundamente ultraliberal que visa a destruição das funções sociais do Estado, a privatização de serviços públicos essenciais ao bem-estar geral e qualidade de vida das populações, a redução ou aniquilação da participação dos trabalhadores, dos cidadãos nas diferentes estruturas a isso dedicadas.

Entre os diversos elementos e factores introduzidos nesta ofensiva global, a reforma administrativa do mapa autárquico que levou já, numa primeira fase, à redução do número de freguesias, aniquilando freguesias constituídas há décadas, promovendo o isolamento de populações por via da quebra da ligação destas com as instituições governativas, criando um quadro propiciador de mais e maiores assimetrias locais tornando assim o País ainda mais desigual.

Por outro lado, aproveitando-se do facto de algumas autarquias locais apresentarem níveis de endividamento relativamente elevados e jogando com o falso argumento do combate ao défice por via da redução das dívidas das autarquias, o Governo Central criou o pomposamente baptizado de PAEL – Programa de Apoio à Economia Local cujo montante e verbas globais disponibilizadas não constituem mais do que as mesmas verbas que foram sonegadas a esses mesmos municípios ao longo dos últimos anos e que, a troco da concessão de empréstimos a juros bonificados, compromete o Poder Local a uma série de requisitos e obrigações que, em caso de incumprimento, resultarão em mais penalizações para os munícipes e para as suas famílias. A perda de autonomia do Poder Local, dos municípios aderentes a este programa é evidente e consubstancia-se, no caso dos municípios integrados no Programa I (o mais penalizador) na obrigação de aumento de todas as taxas e tabelas municipais (IMI incluído) para os valores máximos, a aplicação dos coeficientes de redução de pessoal e todas as outras medidas gravosas contidas nos últimos Orçamentos de Estado no que concerne à redução ou extinção de subsídios, horas extraordinárias e outras fontes de rendimento dos trabalhadores, juntando-se a estes exemplos a redução do investimento camarário, tão necessário ao desenvolvimento local.

Se, no âmbito regional, não se aplica, pelo menos nesta fase, a reforma administrativa, estando assim salvaguardadas as 54 freguesias existentes, o facto de os modelos de gestão aplicados em muitos dos municípios terem conduzido os mesmos a um endividamento que atingiu patamares que escaparam ao controle da maioria que os governa, levando-os a aderir ao referido PAEL, coloca a necessidade de manter uma linha interventiva que minore os efeitos mais negativos desta adesão. Caso concreto de penalização é o do Município de Santa Cruz, inserido no Programa I e que terá que aplicar as medidas mais gravosas contidas no programa a que está sujeito. Noutros concelhos, não sendo a situação tão crítica, a aplicação dos meios financeiros postos à disposição por esta via, correm o sério risco de serem canalizados para o pagamento às grandes empresas, à banca e para alimentar serviços e entidades públicas tuteladas pelo Governo Regional.

No cenário actual de profunda crise económica e social, o Poder Local, embora não se substituindo ao papel que deve competir ao Estado cumprir, pela sua proximidade em relação às populações, pelo seu profundo conhecimento das realidades sociais, económicas, culturais e históricas locais, desempenha um papel fulcral e fundamental na procura de soluções que permitam superar alguns dos aspectos associados à crise, promover algum crescimento e dinamismo económico, apoiar as famílias no dia a dia e na superação das suas maiores dificuldades, promover a inclusão social e um desenvolvimento sustentado.

O Projecto Autárquico da CDU interliga-se a um Poder Local autónomo, actuante, envolvido profundamente com as populações, com os seus anseios e necessidades, motor de promoção de desenvolvimento local, defensor dos serviços públicos essenciais às populações, ao seu bem-estar e à sua qualidade de vida. É um Projecto que promove a participação das populações nas decisões de investimento e de desenvolvimento que lhes dizem directamente respeito, promove a democracia participativa. São estes alguns dos pressupostos do Projecto Autárquico da CDU e que constituem a base das nossas propostas autárquicas e do desenvolvimento do trabalho autárquico dos nossos eleitos locais.

 

2 – Linhas fundamentais para a intervenção e proposta autárquicas

Embora muitos dos problemas sentidos pelas populações dos diversos municípios madeirenses sejam comuns entre si (acessos, saneamento básico, infraestruturas sociais de apoio…), as realidades intrínsecas locais obrigam à apresentação de propostas concretas e específicas para responder a essas necessidades e ausência de condições de desenvolvimento simétrico. Aparte as especificidades locais, podemos identificar algumas grandes linhas comuns de defesa autárquica que constituem elementos a ter presentes em toda a nossa intervenção e proposta. Nestes termos podemos identificar 5 grandes elementos fundamentais comuns a todas as candidaturas autárquicas:

1.º - Reorientação do investimento municipal;

2.º - Gestão participativa das populações;

3.º - Defesa da autonomia e capacidade de intervenção do Poder Local;

4.º - Criação de um modelo de desenvolvimento económico, social e cultural sustentado;

5.º - Defesa e financiamento dos serviços públicos.

1.º - O Poder Local, para responder às diversas questões e problemáticas que surgem fruto do cenário actual de crise, deve procurar reorientar as suas prioridades em termos de investimento local, apostando nas pequenas obras locais, nas localidades, nos sítios. Para isso a grande fatia dos orçamentos camarários deve ser canalizada para o que denominamos de “investimento de proximidade”. Neste “investimento de proximidade” integra-se, também, a reabilitação urbana, nomeadamente nos centros mais antigos das cidades, na recuperação de áreas habitacionais mais degradadas ou de equipamentos públicos, o que possibilitaria o envolvimento das pequenas empresas locais na execução das obras e outras actividades necessárias, promovendo e dinamizando o mercado de emprego e gerando riqueza local. A aposta na reabilitação e requalificação das áreas habitacionais associada a outros programas de investimento local (“programas de intervenção local”), na recuperação de acessibilidades, reparação, substituição ou instalação de redes de saneamento básico, na consolidação de muros de suporte, entre outras acções, permitiria dinamizar a actividade económica em simultâneo com a criação de emprego, promovendo e potenciando a inclusão social ao dotar as populações de acesso a equipamentos e bens que originariam melhores condições de vida e bem-estar para as famílias.

 

2.º - Nestes tempos de crise, as verbas disponíveis para investimento devem ser criteriosamente aplicadas no desenvolvimento de projectos de intervenção local. As grandes obras que constituíam parte significativa dos planos de investimento não têm lugar neste quadro. As populações, conhecedoras das suas dificuldades e dos problemas que localmente as afligem devem ser chamadas a pronunciar-se sobre as questões que a elas dizem directamente respeito e que podem proporcionar mais e melhor desenvolvimento local. A consagração dos princípios do “Orçamento Participativo” como um modelo de participação directa das populações na tomada das decisões que podem influenciar a sua vida, o seu dia a dia, a melhoria das condições existentes nas suas localidades e locais de residência.

A participação na definição das políticas locais tem a sua aplicação, por exemplo, na participação na gestão dos complexos habitacionais. Desde há muito que defendemos a participação dos moradores dos denominados bairros sociais na gestão dos mesmos, dos espaços comuns, das áreas de lazer e fruição existentes. Tratando-se de espaços de concentração populacional constituídos por cidadãos oriundos dos mais diversos ambientes sociais, com vivências diversas, com níveis culturais e de cidadania distintos, a participação na gestão e até manutenção dos espaços de utilização comum constitui uma forma de integração no meio e de inclusão social a não menosprezar.

 

3.º - Com a adesão ao denominado PAEL – Programa de apoio à Economia Local, os municípios vêm-se confrontados com novas formas de controle da sua actividade e desenvolvimento daquelas que são a suas funções sociais. Ao abrigo da necessidade de pagamento das dívidas acumuladas (embora em alguns casos esses pagamentos possam significar a injecção de verbas na economia local), o Poder Local corre o sério risco de perda da sua identidade e da sua autonomia efectiva. A obrigatoriedade de aplicação de diversas medidas plasmadas nos acordos assinados ao abrigo deste programa poderá originar a perda de efectividade na prestação dos serviços a que os municípios estão obrigados para com as populações. A redução dos quadros de pessoal implicará ou proporcionará recorrer à prestação de certos serviços por parte dos privados, criando assim as condições para a privatização de importantes serviços públicos. Numa época em que a crise dita as suas leis, a redução do investimento público (outra das obrigações contidas no acordo de adesão ao PAEL) constitui um golpe profundo para a economia e para o desenvolvimento locais. A possibilidade de aumento das taxas e outros impostos municipais constitui outra das formas de penalização para as famílias e para a actividade económica já de si tão castigadas pelos efeitos da crise. A contestação à aplicação destas medidas, a apresentação de propostas alternativas para fazer face aos possíveis impactos negativos da aplicação de tais medidas tem que constituir uma das prioridades de intervenção local.

 

4.º - Exige-se um modelo de desenvolvimento local que combata as assimetrias e proporcione às populações o acesso a bens e serviços essenciais e a melhoria geral da qualidade de vida e bem-estar. Os denominados “planos estratégicos de desenvolvimento” devem constar das prioridades. A elaboração destes planos permitira abarcar uma série de questões e pressupostos para um desenvolvimento sustentado e sustentável das localidades beneficiando no seu conjunto os concelhos. A intervenção ao nível da melhoria das acessibilidades às áreas residenciais, apostando onde tal fosse possível na perspectiva do acesso à rede de transportes públicos, o alargamento da cobertura desta mesma rede a áreas ainda sem acesso directo ou mais próximo a este serviço, noutros casos a aposta em criar as condições para uma maior efectiva circulação dos transportes públicos visando servir mais directamente as populações adequando a sua frequência e as carreiras e percursos às necessidades de mobilidade das populações e da própria actividade económica, a criação de uma rede de equipamentos públicos que possam servir directamente para o usufruto das populações (parques, jardins, espaços para a prática desportiva…), a delimitação de áreas e localidades para a reabilitação e requalificação constituindo-se como elementos fundamentais para o ordenamento do território.

Este modelo de desenvolvimento que se deseja equilibrado, sustentado e sustentável não pode omitir as questões de âmbito social, o combate à pobreza e exclusão sociais, a implementação de programas sociais de apoio às famílias e estratos sociais com maiores dificuldades e insuficiências no acesso a alimentos, medicamentos, transportes públicos ou na manutenção das suas habitações, através da consagração do “orçamento solidário” como definição destes apoios.

A “democratização”da cultura através da criação de condições para um acesso mais próximo aos bens culturais tem que constar das prioridades de intervenção local. Por “democratização” da cultura também se entende a aposta das autarquias em desenvolver programas culturais e actividades diversas em cooperação e colaboração com outras entidades públicas e privadas com o intuito de permitir a todos desfrutar dos bens culturais como elementos cruciais para o desenvolvimento humano e social. Às autarquias locais compete, também, a promoção do livre acesso à cultura, sem elitismos, sem diferenciação entre cidadãos. O acesso aos bens culturais constitui um direito inalienável de todos os cidadãos e o Poder Local pode desempenhar um papel importante neste capítulo.

 

5.º - A defesa dos serviços públicos e de que “o público é de todos e o privado só de alguns” deve constituir uma das acções fundamentais da intervenção autárquica. O combate a todas as tentativas de destruição dos serviços públicos, de privatização de serviços essenciais às populações, à sua qualidade de vida e bem-estar. É comum a referência a tentativas ou intenções de privatização de serviços públicos nas mais variadas áreas. Desde os transportes públicos, à recolha do lixo, ao fornecimento de água, aos correios, vagas de privatizações estão anunciadas ou em vias de concretização. A defesa do serviço público surge como uma forma de defender as populações, a integridade territorial, a manutenção de serviços essenciais na esfera pública, impedir que sejam as populações a suportar mais e mais custos no acesso a esses mesmos serviços. O serviço público é essencial para a qualidade de vida e a sua manutenção no espaço público uma mais valia para todos os cidadãos.

A par da defesa da manutenção na esfera pública de serviços essenciais, importa criar condições adequadas ao seu funcionamento. A modernização dos serviços, a concretização de investimentos importantes para assegurar os meios necessários ao desempenho das funções primordiais para que estão vocacionados, a necessária afectação dos recursos humanos para garantir o desempenho dessas funções, todos estes factores constituem referências a ter em conta na actividade autárquica e na defesa da capacidade das autarquias em desempenhar o seu papel inestimável e insubstituível para as comunidades.

 

3 – Intervenção imediata

Tendo por base estas 5 linhas estratégicas podemos formular algumas intervenções concretas imediatas:

1 – Defender a elaboração dos “Programas de Desenvolvimento Local”, em articulação com as Juntas de Freguesia, procurando responder às necessidades locais em termos de desenvolvimento, quer nas áreas das acessibilidades, saneamento básico, segurança, quer da implementação de uma rede de equipamentos locais para usufruto das populações;

2 – Determinar uma fatia do investimento camarário (até 70%) canalizado especificamente para a criação de infraestruturas diversas (acessos, saneamento básico, intervenções de recuperação e integração urbanística) nas zonas mais afastadas do centro, nas zonas altas ou mais isoladas criando assim um modelo de continuidade territorial e combatendo as assimetrias;

3 – Definir a reabilitação urbana como um elemento fundamental na revitalização das cidades e dos concelhos apostando em 4 vertentes: núcleos históricos, zonas primárias de expansão (primeiros núcleos urbanos fora dos centros antigos), zonas altas ou de concentração de habitação de génese ilegal e bairros sociais;

4 – Implementação do “Orçamento Participativo” como elemento fundamental na definição das prioridades de intervenção local, alargando esse conceito à gestão das Freguesias, envolvendo directamente as populações na definição dos projectos de maior impacto e ligação às necessidades de desenvolvimento local;

5 – Definir modelos de participação activa dos moradores dos bairros sociais e complexos habitacionais sob a responsabilidade camarária ou, em cooperação com outras entidades (IHM – Investimentos Habitacionais da Madeira) quando se verificarem situações habitacionais mistas;

6 – Propor medidas tendentes a reforçar a capacidade dos municípios em disporem de receitas para a manutenção da sua actividade, assim como a exigência de cumprimento por parte de outras entidades públicas dos contratos-programa e outros meios de financiamento que são devidos pelas autarquias locais;

7 – Na defesa das populações, das famílias já penalizadas pelo aumento dos impostos e pela redução dos salários e de outras formas de rendimento, desenvolver uma intervenção baseada no propósito de combater todas as formas de onerar as famílias, seja pelo aumento das taxas municipais, seja pela via do IMI – Imposto Municipal sobre Imóveis, através do desenvolvimento de uma linha de intervenção que permita um equilíbrio e a definição justa e equitativa dos diversos coeficientes aplicados, criando mecanismos de cooperação entre os Municípios e os Serviços de Finanças;

8 – A definição de uma política social que não se baseie somente na atribuição de apoios pontuais (cabazes de compras, por exemplo) mas na definição de um programa de intervenção mais vasto e abrangente que permita prestar apoios variados às famílias e estratos sociais mais fragilizados e que potencie a inclusão social;

9 – A aposta na descentralização de competências para as freguesias, alargando o âmbito da intervenção autárquica e aproximando ainda mais o poder local das populações, possibilitando assim abranger um leque mais alargado de intervenções e uma maior capacidade de resposta na satisfação das necessidades das populações.

 

Existem problemas e cenários comuns a todos os municípios, a todos os concelhos da Região Autónoma da Madeira. Em alguns casos, as especificidades concelhias exigem intervenções e propostas concretas para a resolução dessas situações específicas. Em alguns concelhos (como o Funchal e Santa Cruz, por exemplo), a pressão urbanística implica uma intervenção cuidada ao nível do ordenamento do território, na defesa de um crescimento sustentado que não implique uma excessiva betonização ou que crie mecanismos para “suavizar” essa betonização e elementos para enquadramento do espaço em termos paisagísticos e ambientais. Noutros concelhos de maior incidência agrícola (Câmara de Lobos e Ribeira Brava, por exemplo), a autarquia não pode ficar indiferente às questões relacionadas com a actividade económica ligada à agricultura. Noutros concelhos, a preponderância para as actividades ligadas ao turismo nas suas mais variadas vertentes (ambiental, cultural, histórico) devem ser analisadas e perspectivadas dentro do âmbito de actuação e intervenção do Poder Local.

 

Em traços gerais, não constituindo este documento um manifesto eleitoral, pretende definir pontos essenciais de actuação e desenvolvimento de propostas que dão corpo a um Projecto Autárquico que é abrangente e transversal a todas as áreas e que, no essencial, procura responder aquelas que são as maiores necessidades e anseios das populações no acesso a bens e serviços capazes de melhorarem significativamente a sua qualidade de vida e bem-estar, no desenvolvimento equilibrado e equitativo das localidades, no cumprimento do dever de serviço público virado para a satisfação das necessidades gerais, sempre mantendo as funções básicas e essenciais numa esfera de actuação pública.