Sobre a Lei de Finanças Regionais

I- Processo crítico

Ao longo dos anos, o PCP tem insistentemente chamado a atenção para a extrema gravidade do quadro económico e financeiro da Região, resultado directo de décadas de políticas de direita e das erradas opções quanto ao desenvolvimento regional, que consolidaram profundas fragilidades e dependências do tecido económico, e que conduziram ao agravamento da situação económica geral da Região e à deterioração do seu quadro financeiro aproximando-se perigosamente de uma situação de “insolvência” da Autonomia, de colapso e de falência técnica. Um risco de falência técnica decorrente da profunda debilidade da economia traduzida na dificuldade de gerar receitas e, principalmente, devido à dependência de recursos externos em que avulta o indevidamente excessivo.

 

A extensão e profundidade da crise económica e financeira da Região, longe de se circunscrever a um circunstancial abrandamento conjuntural de economia regional, é consequência directa de erradas políticas de longos anos de governação PSD. Uma crise e recessão económicas à escala regional cujas consequências mais directas são duramente experimentadas em diversos sectores económicos e em áreas de actividade, penalizando e prejudicando cada vez mais extensas e diversas camadas sociais.

Mas o avolumar da crise económica regional está ainda, e também, associada a outros factores relevantes como a diminuição dos apoios financeiros da União Europeia e das verbas do Orçamento de Estado em virtude da Lei de Finanças Regionais, aprovada em 2007.

A negociação relativa a fundos comunitários para o quadro 2007-2013 foi desastrada e desastrosa para a Madeira. Foi desastrada na forma indolente e subserviente como o Governo Regional acompanhou a negociação. Foi desastrosa porque a diminuição do fluxo financeiro para a Madeira - num valor estimado em cerca de 500 milhões de euros - contribuiu para acentuar o retrocesso económico e social. A retirada da Madeira do Objetivo 01 atribuído às “regiões de convergência” – resultado da irresponsável instrumentalização para o valor de cálculo do PIB per capita da “riqueza” estatística gerada no offshore da Região, inflacionando artificial e ilusoriamente o PIB regional sem qualquer tradução real em benefício dos madeirenses – teve repercussões extremamente negativas no plano do emprego e nas condições de vida das populações.

Como então o PCP alertou e denunciou, aquando da discussão e votação das perspectivas financeiras para 2007-2013, a forma irresponsável como a negociação desse quadro de apoio comunitário foi conduzida traduziu-se num corte acentuado de fundos comunitários e cavou mais fundo o fosso de crise económica e social.

Por outro lado, a imposição em 2007, pela maioria absoluta do PS, de uma nova Lei de Finanças Regionais, injusta e discriminatória impôs restrições financeiras que prejudicaram sobretudo quem vive e trabalha na RAM. De acordo com o relatório da “Utilidade Técnica de Apoio Orçamental” (UTAO) da Assembleia da República, a Lei de Finanças Regionais prejudicou a Região, entre 2007 e 2009, em mais de 157 milhões de euros.

Estes factores, não sendo determinantes, assumiram no quadro de um modelo de desenvolvimento fracassado um peso importante na configuração de uma realidade económica e social caracterizada pela recessão e pelos profundos impactos da crise à escala regional.

As alterações materializadas em 2011 quanto aos meios financeiros para a Madeira e a aplicação do “Programa de Agressão” da Troika à Região e ao Povo contribuíram para a configuração do actual estado de catástrofe económica e social na RAM.

 

II- Intensificação dos ataques contra Autonomia

Se o anterior processo legislativo atentou contra princípios fundamentais da Autonomia e lesou direitos e o interesse financeiro das Regiões Autónomas, a actual proposta legislativa sobre Finanças Regionais merece a nossa completa discordância pelas seguintes razões:

 

  1. A proposta do Governo PSD/CDS ataca a Autonomia e subverte princípios basilares pelos quais se deveria reger a mais elementar autonomia financeira das Regiões Autónomas. Há, desde logo, uma grosseirasubversão do princípio da solidariedade nacional em relação às regiões insulares distantes. A proposta do Governo PSD/CDS ignora que é dever do Estado assumir solidariamente os custos das desigualdades derivadas da insularidade distante. E ao pretender impor um garrote financeiro às Regiões Autónomas, ao querer reduzir as transferências orçamentais e ao limitar o investimento público, ao impedir outros níveis de desenvolvimento regional, a proposta do Governo PSD/CDS confirma uma linha política insólidária para com o povo das ilhas. Tal lógica de subversão da solidariedade nacional vai ao ponto de estipular a proibição do Estado poder dar garantia aos empréstimos a emitir pelas Regiões, de assumir responsabilidade pelas obrigações destas e de assumir os compromissos que decorrem dessas obrigações.
  2. A proposta do Governo do PSD/CDS invade bossalmente a Autonomia política e legislativa das Regiões Autónomas consagrada na Constituição e nos Estatutos Político-Administrativos das Regiões Autónomas. As competências dos órgãos de governo próprio das Regiões são postas em causa nos diversos exemplos de inaceitável intromissão centralista em tudo quanto se reporta aos poderes de fiscalização política e acompanhamento de execução orçamental, à monitorização dos procedimentos governamentais e quanto à decisão de eventuais sanções politicas. No actual quadro constitucional das Autonomias, para além dos poderes próprios de fiscalização do Tribunal de Contas, apenas os Parlamentos Regionais podem exercer poderes de fiscalização e de acompanhamento das políticas realizadas pelos executivos regionais. Ora, a imposição de poderes de supervisão do Estado colidem com as competências político-orçamentais das Regiões, o que é inaceitavelmente centralista, é inconstitucional e anti-autonómico. Como o são, também, as propostas para a criação de sanções político-financeiras unilateralmente impostas por entidades estranhas às Regiões, ou, entre outros casos, a imposição de condições de prévios pareceres à livre iniciativa política e legislativa dos Parlamentos Autónomos.
  3. A proposta do Governo PSD/CDS, a par das restrições às condições de financiamento das Autonomias, esvazia de conteúdo o poder tributário e as atribuições fiscais consagrados pela Constituição e pelos Estatutos Político-Administrativos de cada uma das Regiões. Este esvaziamento de poderes e atribuições autónomas fica especialmente patente na definição das incumbências apontadas para o “Conselho de Acompanhamento das Políticas Financeiras”. O papel reforçado daquele Conselho e do âmbito das suas competências vão muito para além da antiga necessidade de se garantir uma coordenação entre as finanças das Regiões Autónomas e as do Estado, para se transformar numa estrutura usurpadora das competências autonómicas, nas áreas fundamentais da política fiscal e sobre a execução orçamental. As restrições das condições e níveis de diferenciação fiscal das taxas dos impostos em relação às aplicadas a nível nacional constitui outro dos condicionamentos inaceitáveis, pois, daquele modo as Regiões Autónomas ficam amputadas quanto a um importante instrumento de política fiscal capaz de compensar desvantagens estruturais para as economias insulares e de suprir desigualdades sentidas pelas populações residentes nas ilhas distantes.

 

É por tudo isto que, às medidas governamentais da responsabilidade do PSD/CDS que lesam as Regiões Autónomas, é preciso contrapor uma resposta política de reprovação, de não resignação. Aos raciocínios centralistas que a Direita tenta impor, utilizando estratagemas para asfixiar a autonomia financeira e, assim, negar direitos dos povos das ilhas, importa contrapor com firmeza medidas que contrariam interesses vitais da Autonomia e direitos de quem vive nessas regiões.

Em tempo próprio apresentaremos, em alternativa às injustas pretensões do PSD e do CDS, propostas específicas para uma justa revisão da Lei das Finanças Regionais.

 

 

Pelo PCP/Madeira